segunda-feira, 10 de junho de 2013

EU GOSTO DE LER PAULO COELHO, DE TOMAR INJEÇÃO E DE COMER JILÓ… EU GOSTO. E GOSTO NÃO SE DISCUTE, CERTO?(EBERTH VÊNCIO)

 

"Eu nunca sonhei com você, nunca fui ao cinema, não gosto de samba, não vou a Ipanema, não gosto de chuva, nem gosto de sol"

(Tom Jobim)

Eu gosto também de me resfriar com as chuvas de verão. Gosto da coriza, dos 40 graus de febre, de curtir ressaca brava e de preparar fumegantes chás de boldo. De amarga, já basta a vida? Ao contrário das seriemas e do resto da humanidade, eu gosto das cobras (porque, como eu, elas engolem sapos).

Eu gosto de votar em políticos que adesivam o meu carro com fotos, números e slogans, que encham semanalmente o tanque de gasolina, e que coloquem créditos no meu aparelho celular. Eu gosto de acordar bem cedo no domingo e votar no primeiro candidato cretino que me venha à mente. Bom mesmo é vender o voto. Eu gosto de desfazer planos para o futuro, entende?

Eu gosto de provocar indignação, de gerar dúvidas. Eu gosto de contrair matrimônio e dívidas. Eu gosto de adoecer só para ler as bulas de remédios. Eu gosto de atestados médicos. Eu gosto de remediar. Eu gosto de furar qualquer tipo de fila, desde que não sejam filas da puta, nem filas para as câmaras nazistas para extermínio. Eu gosto do atual salário mínimo.

Eu gosto de levar susto. Eu gosto do atendimento do SUS. Eu gosto de hospitais, do cheiro do éter, de viajar na maionese, ser acometido por colônias de salmonelas e pensamentos inovadores. Eu gosto das dores do parto. Eu gosto da diarreia, da gonorreia e dos biscoitos embolorados da Dona Neia. Eu gosto de comer hóstia, escargot e o pão que o diabo amassou.

Eu gosto de carregar bíblias sob o sovaco para construir escolioses eternas. Eu gosto de suar a camisa em templos lotados de crentes. Eu gosto de cerveja quente, de boi doente e de mulher da gente. Eu sou como a maioria de vocês: eu gosto de me sentir diferente, embora que seja igual a todo mundo.

Eu gosto dos shows que atrasam além dos vinte minutos previstos em lei. Eu gosto de frequentar baladas com música ruim, só pra pegar mulher boa. Eu gosto das poposudas da laje, das peitudonas da marquise, das siliconadas do terraço. Eu gosto (admiro pra-caralho) de todos os cirurgiões plásticos do planeta. Eu gosto de cantar de cor e salteado todos os refrões onomatopeicos da música popular brasileira, desde o "tchan tchan tchan tchan tchan" até o "tchê tchererê tchê tchê". Eu gosto, enfim, de todo tipo de música comercial que venda bem não importando a quem. Eu gosto mesmo é da quantidade.

Eu gosto de construir torres gêmeas com livros de capa dura, principalmente os clássicos da literatura, a chamada "leitura essencial". Eu gosto de meter o pé em todas elas, derrubando-as como se fosse Bin Laden. Eu gosto de toda aquela filosofia esparramada pelo chão. Eu gosto de desmentir os Pensadores.

Eu gosto de frequentar academias literárias, de acordar os velhinhos imortais recostados nas suas bengalas, de tomar chá gelado com eles, de comer bolachas sabor água e ouvir saraus insossos. Eu gosto de gente que não larga o osso. Eu gosto de massagear o ego dessa gente. Eu gosto das massagens a quatro mãos das universitárias legítimas que executam qualquer fantasia sexual, até o fim e sem frescura.

Eu gosto do calor da discussão. Eu gosto de ficar preso no congestionamento curtindo o por do sol. Eu gosto de saber que a indústria automobilística quebrou mais um recorde de vendas de carros novos. Eu gosto da isenção do IPI. Eu gosto das metas do Governo. Eu gosto de superávits primários, embora não faça ideia do que isto significa. Eu gosto de me divertir com depoimentos na CPI do Congresso. Eu gosto de pagar Imposto de Renda. Eu gosto das calcinhas de renda da Doutora Mirtes.

Eu gosto do horário eleitoral gratuito. Eu gosto de ouvir "A Voz do Brasil". Eu gosto das propagandas da Casa Bahia. Eu gosto de depilar as virilhas. Eu gosto da cava rasa, da cava funda, da depilação a laser e do lazer garantido. Eu gosto do meu urologista. Eu gosto dos períodos de carência dos planos de saúde. Eu gosto de brindar com vinho barato.

Eu gosto de quebrar o espírito natalino. Eu gosto desta fama de ateu. Eu gosto de contar piadas em velórios. Eu gosto de parar o carro em fila dupla para espiar como foi mesmo o acidente. Eu gosto de dor de dente. Eu gosto de beijar o seu mau hálito. Eu gosto de tártaros. Eu gosto dos meus maus hábitos. Eu gosto de nadar e morrer na praia. Eu gosto de ressuscitar dúvidas ao terceiro dia. Eu gosto das terceiras vias.

Eu gosto das vaias, dos apupos e das poluções noturnas sobre o lençol. Eu gosto dos efeitos colaterais dos remédios e das reações adversas dos críticos. Eu gosto do suposto romance de Cristo com Madalena. Eu gosto do sabor da cibalena. Eu gosto de criar polêmicas em cativeiro. Eu gosto de ler poesia no banheiro. Eu gosto do gosto de fel dessas palavras. Eu gosto de fingir delírios. Eu gosto. E gosto não se discute, certo?

POR EBERTH VÊNCIO EM 15/02/2013 ÀS 01:06 PM “Sosseguem. Meus dois canos fumegantes só atiram palavras”. Publicado em colunistas "Jogos, trapaças e dois canos fumegantes" (Guy Ritchie, 1998).

(texto retirado de “BULA REVISTA”)

clip_image001É importante deixar claro que o medo do escuro faz parte do rol de fraquezas de qualquer ser humano dito “normal”. Por isso mesmo, a minha repulsa pelas sombras. Não sou emo, não sou dark, nem sou punk: eu simplesmente despertenço a qualquer modalidade de tribo.

É importante frisar que, apesar de ser uma mulher — criatura elencada com defeitos insolúveis, como menstruar, parir e chorar aos menores esforços — eu posso também odiar, trucidar como o mesmo élan do homem que matou o facínora, ou de um homem-bomba, ou do melhor homem de todos os homens do presidente. Sabia que alguns exércitos já permitem (toleram) que mulheres engrossem as suas fileiras? Hoje em dia, engrossar o caldo em casa é coisa só para as amélias.

É importante que você saiba: eu não sei quem mexeu no seu queijo. Não me leia com esta cara de espanto: os ratos também festejam os entulhos em mim.

É importante que surja no próximo conclave do Vaticano o nome de um Papa minimamente assemelhado ao cidadão comum — o brasileiro comum, por exemplo — cuja fé incomum jamais se abala, mesmo nos momentos mais caóticos do viver, quando então a crença num Ser Superior parece, na verdade, um surto dos mais inferiores. Eu também não sei por que Bento XVI renunciou ao papado. Não se deve esperar toda a verdade, muito menos da parte do alto clero. O último a sair, por favor, apague a luz da sacristia.

É importante que a abertura de novos templos fomente a receita, o balanço patrimonial e o fluxo de caixa das igrejas. Muito mais do que acreditar em dogmas, é preciso compreender que a fé (mais que a matemática) involui em regressão geométrica.

É importante que a métrica nunca mais se intrometa e volte a fazer parte da estrutura de um poema (retroceder, jamais!). Eu sinceramente espero (eu praticamente imploro) que a poesia continue a ser publicada pelo maior número possível de editoras, a despeito do inegável prejuízo financeiro que ela representa. Nunca se sabe quando vamos precisar da lira. Conheço um sujeito que desistiu de tomar raticida com coca-cola depois de ler “Os Estatutos do Homem”, de Thiago de Mello. Ao se depararem com poemas como este, até as ratazanas beberiam os seus goles de humanidade.

É importante que ninguém se sinta diminuído por preferir ficar sozinho. Nadar contra a correnteza pode parecer uma coisa bastante idiota, porém, num mundo com tamanhas incertezas, uma a mais, uma a menos, não faz a menor diferença. Portanto, aceitem o meu isolamento. Melhor que isto: unicamente, para o seu conforto, imaginem que eu esteja apenas passeando com amigos numa gôndola em Veneza.

É importante que a indústria farmacêutica evolua nalguma espécie de silicone neuronal cujo implante através de uma das têmporas permita a injeção de juízo na massa encefálica de homens e mulheres. Urge preencher o tempo vazio e o espaço morto, ao invés dos peitos murchos.

É importante que os velhos jamais se furtem em caducar. Ao que parece, numa situação tão crítica e caótica quanto a velhice, faz-se mister esquecer para não mergulhar na insanidade. Aqueles poucos que insistem acabam reféns de Alzheimer.

É importante conhecer a Alemanha, a França, o Reino Unido, o Caribe e, até mesmo, a Disney (O Mundo da Fantasia). Eu admito: não dá mais pra ficar levando o mundo real tão a sério.

É importante buscar algum grau de importância moral na morte (a importância social parece evidente), além do expurgo e da mera assepsia. Para o equilíbrio ideal das coisas, não seria mais aceitável à humanidade parar de nascer, ao invés de morrer o que se ama? Eis aqui uma pergunta que não se calará nem mesmo após o último suspiro.

É importante dar algum crédito aos fatos desimportantes, como um mentecapto que fala com o vazio. Quem poderá assegurar que ele, na verdade, não esteja falando para olhos e ouvidos de outra dimensão? Você já ouviu falar em vidas paralelas? E em palavras cruzadas? Vou sair pela tangente.

É importante que os trocadilhos sejam usados com parcimônia, em doses homeopáticas, pois, o exagero poderá matar um belo texto em potencial. Agora, a chatura exponencial continua a matar de raiva qualquer leitor mais exigente.

É importante que a minha masculinidade não seja questionada pelo simples fato de eu me fazer passar por uma mulher. Há séculos os homens utilizam este artifício, ao se travestirem em busca da autoafirmação. Posso lhes afirmar, sem nenhum receio: eu não me sinto nem um pouco inadequado ao me deparar com um bebê sugando um seio.

É importante ressaltar os benefícios da fantasia no cotidiano do abilolado homem moderno. O faz-de-conta — assim como a oração e as juras de amor eterno na alcova — é uma ilusão passageira, um quase nada perto do que representa estar lúcido e alerta 16 horas ao dia. Normas, leis, regulamentos, estatutos... Ora, ninguém merece tanta ordem!

É importante falar de tudo ao mesmo tempo, num exercício preguiçoso de se dizer praticamente coisa alguma. Ou seja, confundir os pensamentos faz parte da estratégia de qualquer escritor melindroso, mesmo aqueles mais mal intencionados, como eu, por exemplo.

C H O C A N T E: ANTIGAMENTE, TUDO QUE VOCÊ PRECISAVA ERA DE UM ABRAÇO, HOJE, “Às vezes tudo o que se precisa é de um emoticon”… (TEXTO DA BULA-REVISTA)