quinta-feira, 24 de março de 2011

Solar dos Príncipes (de Marcelino Freira – Contos Negreiros)

 

Quatro negros e uma negra pararam na frente deste prédio.

A primeira mensagem do porteiro foi: “Meu Deus!” A segunda: “O que vocês querem?” ou “Qual o apartamento?” Ou “Por que ainda não consertaram o elevador de serviço?”

“Estamos fazendo um filme”, respondemos.

Caroline argumentou: “Um documentário”. Sei lá o que é isso, sei lá, não sei. A gente mostra o documento de identidade de cada um e pronto.

“Estamos filmando.”

Filmando? Ladrão é assim quando quer seqüestrar. Acompanha o dia-a-dia, costumes, a que horas a vítima sai para trabalhar. O prédio tem gerente de banco, médico, advogado. Menos o síndico. O síndico não está.

- De onde vocês são?

- Do Morro do Pavão.

Vamos gravar um longa-metragem.

- Metra o quê?

Metralhadora, cano longo, granada, os negros armados até as gengivas. Não disse? Vou correr. Nordestino é homem. Porteiro é homem ou não é homem? Caroline dialogou: “A idéia é entrar num apartamento do prédio, de supetão, e filmar. Fazer uma entrevista com o morador.”

O porteiro: “Não.”

O pensamento: “Tô fodido.”

A idéia foi minha, confesso. O pessoal vive subindo o morro para fazer filme. A gente abre as nossas portas, mostra as nossas panelas, merda.

Foi assim: comprei uma câmera de terceira mão, marcamos, ensaiamos uns dias, Imagens exclusivas, colhidas na vida da classe média.

Caroline: “Querido, por favor, meu amor.” Caroline mostrou o microfone, de longe. Acenou com o batom, não sei.

Vou bem levar paulada de microfone? O microfone veio emprestado de um pai-de-santo, que patrocinou.

O porteiro apertou o apartamento 101, 102, 108. Foi mexendo em tudo que é andar. Estou sendo assaltado, pressionado, liguem para o 190, sei lá.

A graça era ninguém ser avisado. Perde-se a espontaneidade do depoimento. O condômino falar como é viver com carros na garagem, saldo, piscina, computador interligado. Dinheiro e sucesso. Festival de Brasília. Festival de Gramado. A gente fazendo exibição no telão da escola, no salão de festas do prédio.

Não.

A gente não só ouve samba. Não só ouve bala. Esse porteiro nem parece preto, deixando a gente preso do lado de fora. O morro ta lá, aberto 24 horas. A gente dá as boas vindas de peito aberto. Os malandrões entram, tocam no nosso passado. A gente se abre que nem passarinho manso. A gente desabafa que nem papagaio. A gente canta, rebola. A gente oferece a nossa coca-cola.

Não quer deixar a gente estrear a porra do porteiro. É foda. Domingo, hoje é domingo. A gente só quer saber como a família almoça. Se fazem a mesma festa que a nossa. Prato, feijoada, guardanapo. Caralho, não precisa o síndico. Escute só. A gente vai tirar a câmera do saco. A gente mostra que é da paz, que a gente só quer melhorar, assim, o nosso cartaz. Fazer cinema. Cinema. Veja Fernanda Montenegro, quase ganha o Oscar.

- Fernanda Montenegro não, aqui ela não mora.

E avisou: “Vou chamar a polícia.”

A gente: “Chamar a polícia?”

Não tem quem goste de polícia. A gente não quer esse tipo de notícia. O esquema foi todo montado num puta sacrifício. Nicholson deixou de ir vender churro. Caroline desistiu da boate. Eu deixei a esposa, cadela e filho. Um longa não, é só um curta. Alegria de pobre é dura. Filma. O quê? Dei a ordem: filma.

Começamos a filmar tudo. Alguns moradores posando a cara na sacada. O trânsito que transita. A sirene da polícia. Hã? A sirene da polícia. Todo filme tem sirene de polícia. E tiro. Muito tiro.

Em câmera violenta. Porra, Johnattan pulou o portão de ferro fundido. O porteiro trancou-se no vidro. Assustador. Apareceu gente de todo tipo. E a idéia não era essa. Tivemos que improvisar.

Sem problema, tudo bem.

Na edição a gente manda cortar.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Matéria de Josie Glausiusz, publicada na revista “National Geographic Brasil” de março de 2011–IMPRESSIONANTE!!!

No futuro, quando precisar de um novo órgão, uma pessoa poderá obter outro, cultivado no laboratório das próprias células.

Milhões de pessoas estão na fila por transplante de órgãos no mundo; todos os dias, centenas morrem nessa espera. Não só há escassez de órgãos saudáveis mas também é preciso haver grande compatibilidade entre doador e paciente para que o sistema imune deste último não rejeite o órgão transplantado. Agora, um novo tipo de solução está sendo aperfeiçoado nos laboratórios médicos: órgãos bioartificiais, cultivados nas células dos próprios pacientes. Trinta pessoas já receberam bexiga produzida com essa técnica, e logo será possível usar outros órgãos desse tipo.

A técnica de produção da bexiga foi desenvolvida por Anthony Atala, do Instituto Wake Forest de Medicina Regenerativa. Os cientistas retiram células saudáveis da bexiga enferma do paciente, fazem com que se multipliquem em placas de cultura e depois as transferem para uma matriz com formato de bola e feita em parte de colágeno, a proteína encontrada na cartilagem. As células musculares ficam na porção externa e, na interna, estão as uroteliais (que recobrem o trato urinário). “É como assar um bolo de camadas” diz Atala. “Você coloca as partes uma após outra, esparrama as células.” A bexiga incipiente é incubada à temperatura do corpo até que se células formem um tecido operacional.

Os órgãos sólidos e dotados de muitos vasos sanguíneos, como o rim e o fígado, são mais difíceis de ser cultivados que órgãos ocos, como a bexiga. Mas a equipe de Atala recentemente conseguiu produzir uma parte operacional de fígado humano. Um dos equipamentos usados assemelha-se a uma impressora a jato de tinta e “imprime”, camada por camada, tanto os diferentes tipos de célula, como a matriz do órgão.

Outros laboratórios estão empenhados em produzir órgãos bioartificias. Um maxilar foi criado na Universidade Colúmbia, e, um pulmão, na Universidade Yale. Na Universidade de Michigan, H. Davis Humes criou um rim artificial de células introduzidas em uma matriz sintética. Do tamanho de um telefone celular, o rim já passou por testes em ovelhas – embora ainda não possa ser implantado, ele funciona como uma máquina externa de diálise, com a vantagem de que faz mais do que apenas filtrar as toxinas do sangue, gera também hormônios e cumpre outras funções renais.

Produzir uma cópia de um órgão do paciente nem sempre é possível – por exemplo, nos casos em que o original está danificado demais por causa de câncer. Para esses pacientes, uma solução poderia ser um banco de células–tronco. A equipe de Atala comprovou que elas podem ser coletadas sem prejudicar os embriões humanos (e, portanto, sem controvérsias políticas). Os pesquisadores conseguiram fazer com que tais células se tornassem especializadas em coração, fígado e outros órgãos. Um banco que reunisse 100 mil amostras de célula-tronco, de acordo com Atala, conteria diversidade genética suficiente para se produzir órgãos compatíveis com a maioria dos pacientes. Quando necessário, os cirurgiões encomendariam órgãos já cultivados, em vez de esperar por cadáveres que talvez não sejam compatíveis.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Você soube desta iniciativa do Greenpeace? Aconteceu no dia 24 de fevereiro de 2011.

 

Greenpeace põe no prédio do Congresso uma torre eólica para lembrar aos deputados que a Lei de Renováveis, esperando votação, garante o futuro limpo para o Brasil.

 

Greenpeace protesta em Brasília pela aprovação da Lei de Renováveis. © Greenpeace / Rodrigo Baleia

O dia no Congresso Nacional em Brasília começou movimentado. Por volta das 9h ativistas do Greenpeace entraram em ação para pedir que os deputados federais votem o Projeto de Lei de Renováveis, paralisado desde o final de 2009 na Câmara Federal.

Um grupo de dez pessoas  “plantou” uma torre eólica inflável de 25 metros ao lado da cúpula da Câmara Federal, onde se lia a frase “Energia limpa. Voto no futuro”. Por duas horas os ativistas se mantiveram sentados no local. Quatro pessoas ficaram detidas na Sede da Polícia Legislativa do Senado. Dois fotógrafos da imprensa foram agredidos.

A reação intempestiva dos seguranças é um contraponto às intenções do Greenpeace: promover um desenvolvimento limpo e pacífico do país. O Projeto de Lei 630/03, de autoria do deputado Fernando Ferro (PT-PE), mais conhecido como Lei de Renováveis, é considerado a semente de uma revolução energética capaz de garantir o futuro

segunda-feira, 7 de março de 2011

Vaidade de Florbela Espanca

 

Sonho que sou a poetisa eleita,

Aquela que diz tudo e tudo sabe,

Que tem a inspiração pura e perfeita,

Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade

Para encher todo o mundo! E que deleita

Mesmo aqueles que morrem de saudade!

Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou alguém cá neste mundo…

Aquela de saber vasto e profundo,

Aos pés de quem a Terra anda curvada!

E quando mais no céu vou sonhando,

E quando mais no alto ando voando,

Acordo do meu sonho… E não sou nada!

domingo, 6 de março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

Poesia de Gregório de Matos Guerra

Não vi em minha vida a formosura,
Ouvia falar nela cada dia,
E ouvida me incitava, e me movia
A querer ver tão bela arquitetura.

Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma Mulher, que em Anjo se mentia,
De um Sol, que se trajava em criatura.

Me matem (disse então vendo abrasar-me)
Se esta a cousa não é, que encarecer-me.
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me.

Olhos meus (disse então por defender-me)
Se a beleza hei de ver para matar-me,
Antes, olhos, cegueis, do que eu perder-me.

Fragmento do Sermão da Sexagésima / Padre Antônio Vieira

II

Semen est verbum Dei.

O trigo que semeou o pregador evangélico, diz Cristo que é a palavra de Deus. Os espinhos, as pedras, o caminho e a terra boa em que o trigo caiu, são os diversos corações dos homens. Os espinhos são os corações embaraçados com cuidados, com riquezas, com delícias; e nestes afoga-se a palavra de Deus. As pedras são os corações duros e obstinados; e nestas seca-se a palavra de Deus, e se nasce, não cria raízes. Os caminhos são os corações inquietos e perturbados com a passagem e tropel das coisas do Mundo, umas que vão, outras que vêm, outras que atravessam, e todas passam; e nestes é pisada a palavra de Deus, porque a desatendem ou a desprezam. Finalmente, a terra boa são os corações bons ou os homens de bom coração; e nestes prende e frutifica a palavra divina, com tanta fecundidade e abundância, que se colhem cento por um: Et fructum fecit centuplum.

Este grande frutificar da palavra de Deus é o em que reparo hoje; e é uma dúvida ou admiração que me traz suspenso e confuso, depois que subo ao púlpito. Se a palavra de Deus é tão eficaz e tão poderosa, como vemos tão pouco fruto da palavra de Deus? Diz Cristo que a palavra de Deus frutifica cento por um, e já eu me contentara com que frutificasse um por cento. Se com cada cem sermões se convertera e emendara um homem, já o Mundo fora santo. Este argumento de fé, fundado na autoridade de Cristo, se aperta ainda mais na experiência, comparando os tempos passados com os presentes.

Lede as histórias eclesiásticas, e achá-las-eis todas cheias de admiráveis efeitos da pregação da palavra de Deus. Tantos pecadores convertidos, tanta mudança de vida, tanta reformação de costumes; os grandes desprezando as riquezas e vaidades do Mundo; os reis renunciando os cetros e as coroas; as mocidades e as gentilezas metendo-se pelos desertos e pelas covas; e hoje? -- Nada disto. Nunca na Igreja de Deus houve tantas pregações, nem tantos pregadores como hoje.

Pois se tanto se semeia a palavra de Deus, como é tão pouco o fruto? Não há um homem que em um sermão entre em si e se resolva, não há um moço que se arrependa, não há um velho que se desengane. Que é isto? Assim como Deus não é hoje menos onipotente, assim a sua palavra não é hoje menos poderosa do que dantes era. Pois se a palavra de Deus é tão poderosa; se a palavra de Deus tem hoje tantos pregadores, porque não vemos hoje nenhum fruto da palavra de Deus? Esta, tão grande e tão importante dúvida, será a matéria do sermão. Quero começar pregando-me a mim. A mim será, e também a vós; a mim, para aprender a pregar; a vós, que aprendais a ouvir.

Questionário sobre o texto “BARROCO”

 

1) Em que período de tempo aconteceu o barroco?

2) Por que as obras de arte barrocas brasileiras são parecidas com as obras de arte Européias?

3) Os artistas barrocos brasileiros foram fortemente influenciados pela arte barroca de dois países Europeus. Quais são estes países?

4) Enumere três características da arte barroca.

5) No Brasil, o início do barroco foi marcado pela publicação de um poema épico. Qual é o nome deste poema, quem o escreveu e em que ano ele foi publicado?

6) O que significa a palavra “barroco”?

7) Cite três autores barrocos brasileiros.

8) Disserte sobre Gregório de Matos.

9) Disserte sobre Padre Antônio Vieira.

Língua Portuguesa – Literatura / Barroco

O termo barroco denomina  as manifestações artísticas ocorridas do final do século XVI ao final do século XVIII. Encontramos manifestações artísticas barroca na literatura, na música, na pintura, na escultura e na arquitetura daquela época.

As obras de arte barrocas brasileiras são muito parecidas com as obras de arte barrocas Européias. Os artistas brasileiros que produziram suas obras de arte neste período foram fortemente influenciados pelo que acontecia no Velho Continente.

Aqui no Brasil, Gregório de Matos, Botelho de Oliveira e Frei Itaparica produziram várias obras de arte com características parecidas com as obras de arte que eram produzidas pelos artistas Europeus, principalmente espanhóis e portugueses.

As principais características das obras de arte barroca são o jogo de idéias, o rebuscamento e a assimetria ou falta de proporção.

O barroco aconteceu em uma época de grande turbulência político-econômica. Nesta época também havia uma grande turbulência na vida religiosa Européia, que se refletia em várias de suas colônias.

O marco inicial do barroco brasileiro é o poema épico “Prosopopéia”, de Bento Teixeira, o qual foi publicado em 1601, e que exalta Jorge Albuquerque Coelho, terceiro donatário da capitania de Pernambuco.

A origem da palavra “barroco” é controvertida. Para alguns estudiosos, ela designaria um tipo de pérola de forma irregular, para outros estudiosos, ela designaria um terreno desigual, assimétrico.

Principais representantes do Barroco Brasileiro

Os autores mais representativos do barroco no Brasil são Gregório de Matos, Bento Teixeira, Padre Antônio Vieira e Frei Manuel de Santa Maria Itaparica.

Gregório de Matos nasceu em Salvador, em 1636, estudou em Coimbra, onde trabalhou até 1681, e então retornou ao Brasil quando tinha 47 anos. Ao chegar ao Brasil desentendeu-se com o arcebispo João da Madre de Deus, o que ocasionou para o poeta vários problemas, chegando a ser acusado de herege ao tribunal da Santa Inquisição. Por suas poesias, em que denunciava os costumes do povo baiano de todas as classes sociais, recebeu o apelido de “boca do inferno” ou “boca de brasa”.

Padre Antônio Vieira nasceu em Lisboa, em 1608, e ainda criança, veio para o Brasil. Em 1614 iniciou seus estudos no Colégio dos Jesuítas de Salvador. Em 1623 ingressou na Companhia de Jesus. Em 1634 ordenou-se sacerdote, destacando-se como missionário em terras brasileiras. Nesta qualidade, defendeu infatigavelmente os direitos humanos dos povos indígenas, combatendo a sua exploração e escravização e fazendo a sua evangelização. O Padre Antônio Vieira escreveu 700 sermões, sendo os mais conhecidos o sermão da Sexagésima e o Sermão do Bom Ladrão.

Meus Oito Anos

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Como são belos os dias
Do despontar da existência !
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é – lago sereno,
O céu – um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida – um hino d’amor !

Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar !
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !

Oh ! dias de minha infância !
Oh ! meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã !
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã !

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
De camisa aberta ao peito,
- Pés descalços, braços nus -
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis !

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo,
E despertava a cantar !

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Casimiro de Abreu